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31.10.2023

Hot Talks 6 de 7: Christine Vuong - Como funciona a Translocação Bacteriana e o que podemos fazer sobre isso?

A equipe de gestão de produtos Sangrovit® convidou sete especialistas de renome para partilharem os seus conhecimentos e fornecerem informações sobre a interação entre o sistema imunitário, a inflamação e a microbiota intestinal, por um lado, e a saúde e o desempenho dos animais, por outro. Hoje apresentamos uma entrevista com Christine Vuong da Universidade do Arkansas, nos Estados Unidos.
Alimentação Ciência e pesquisa Desafíos

Anja Pastor: Christine, muito obrigada por estar conosco hoje e por nos dar a oportunidade de falar sobre um tópico fascinante: a translocação bacteriana. Vamos nos aprofundar diretamente no assunto: o que é translocação bacteriana?

Christine N. Vuong: Translocação bacteriana é a colonização inadequada de bactérias do intestino em outras partes do corpo. A microbiota intestinal, mesmo os microrganismos benéficos utilizados para a digestão, pode causar problemas de saúde e doenças quando fora do ambiente intestinal. A translocação bacteriana ocorre após danos na parede ou barreira gastrointestinal. Em um animal saudável, a parede intestinal seleciona quais nutrientes e células podem se mover entre o lúmen do trato gastrointestinal para os sistemas sistêmicos do corpo.

Quando ocorre danos a essa função de barreira, bactérias (e outros microrganismos) do ambiente intestinal são capazes de entrar nos sistemas do corpo e colonizar outros órgãos. Esta função de barreira intestinal danificada e prejudicada é comumente conhecida como síndrome do ‘intestino permeável’. Vários tipos de estresse podem causar danos à barreira intestinal para favorecer condições de translocação bacteriana. Alimentos com muita fibra indigestível, alimentos que causam o aumento da viscosidade da digesta intestinal, estresse ambiental (altos níveis de amônia, má qualidade da cama, estresse por calor/frio) ou incidências de doenças (metabólicas e infecciosas) podem induzir vários níveis de intestino permeável.

AP: Quando as aves são mais suscetíveis à translocação bacteriana?

CV:
Um grande fator estressante em aves ocorre com 2-3 semanas de idade, quando a imunidade materna nos pintainhos diminui. É quando as aves são bombardeadas por múltiplas doenças infecciosas e devem montar uma resposta imune adequada a todos esses patógenos; assim, normalmente observamos o flushing nesta idade. Isso também ocorre em outras espécies, particularmente no desmame. Em reprodutoras e galinhas poedeiras de vida mais longa, a produção altamente intensiva pode causar estresse sistêmico no corpo e fazer com que as aves sejam mais suscetíveis ao intestino permeável e a translocação bacteriana.

AP: Como a inflamação intestinal favorece a translocação bacteriana?

CV: A inflamação demanda muita energia e é tipicamente benéfica quando o sistema imunológico está funcionando corretamente e usando a inflamação como uma resposta de curta duração para prevenir doenças ou infecções.

Mas a inflamação também pode ser prejudicial, especialmente em condições de inflamação crônica. Muita inflamação danifica as junções de oclusão (tight junctions) entre as células epiteliais, levando a uma função de barreira intestinal prejudicada.

Infelizmente, isso pode criar um loop de feedback no qual o dano inicial à barreira intestinal permite que a translocação bacteriana ocorra, e a consequente colonização bacteriana indesejada em outros órgãos periféricos induz mais inflamação. Essa disfunção pode alterar negativamente o microbioma, prejudicar a capacidade do sistema imunológico de funcionar corretamente e resultar em um frango com a saúde prejudicada e menos produtivo.

AP: Com base na sua experiência – quão relevante é a translocação bacteriana para a avicultura? Você pode estimar quantas aves são afetadas pela translocação bacteriana?

CV:
Todos os animais têm algum nível de estresse que pode causar flutuações na inflamação em todo o corpo. As aves também estão sujeitas ao estresse, principalmente porque são criadas em maior densidade e têm maiores demandas fisiológicas de produção e de crescimento do corpo no menor espaço de tempo.

A quantidade exata de aves afetadas pela translocação bacteriana é desconhecida e difícil de estimar, pois também há diferentes níveis de inflamação intestinal.

AP: Por que algumas granjas são mais afetadas pela translocação bacteriana em suas aves do que outras?

CV: Fatores ambientais e de manejo desempenham um papel importante no controle da translocação bacteriana em nível de granja. As condições de produção em alto desempenho atuais  (dieta, temperatura, qualidade da cama, qualidade do ar, qualidade da água e qualidade da alimentação) podem induzir inflamação intestinal de forma inevitável, predispondo o intestino à translocação bacteriana. Vários fatores estressantes simultâneos podem exacerbar a inflamação. As doenças infecciosas endêmicas da área também afetam as condições de saúde das aves.

O manejo dessas doenças (por vacinação ou biosseguridade) pode reduzir muito o intestino permeável induzido por patógenos. Linhagens específicas de aves também podem ser geneticamente resistentes ou suscetíveis a diferentes estressores ambientais e doenças. Com base na raça ou linhagem utilizada em uma determinada instalação, a interação entre genética e os fatores externos resulta em níveis variáveis de inflamação intestinal para cada granja.

AP: A translocação bacteriana é apenas relevante para frangos ou também para galinhas poedeiras? E quanto a outros animais?

CV: O estresse fisiológico ocasionado pelo rápido crescimento muscular e pela produção de ovos pode causar inflamação em todo o corpo, incluindo no trato gastrointestinal. Isso também vale para outros animais de produção que passam por fases de crescimento ou de alta produção. Além do estresse fisiológico, todos os animais são influenciados pelo ambiente em que são criados e pela inflamação resultante associada a esse ambiente, até mesmo os seres humanos.

AP: Como o impacto negativo da translocação bacteriana pode ser minimizado em nível de granja?

CV: Uma boa nutrição, a manutenção de um ambiente saudável e a prevenção de doenças podem minimizar muito a inflamação e as incidências de translocação bacteriana.

Diferentes componentes alimentares podem alterar o ambiente intestinal, causando mais inflamação intestinal do que outros (por exemplo, polissacarídeos não amiláceos). Além de prejudicar o intestino, esses componentes alimentares também podem indiretamente permitir a colonização de bactérias patogênicas.

Entender a sua alimentação e como essa formulação pode influenciar a saúde (não apenas parâmetros de crescimento ou produção) é muito importante para controlar e minimizar a translocação bacteriana.

AP: Como a translocação bacteriana pode ser avaliada em nível de granja e em condições acadêmicas? Existe uma maneira não invasiva de fazer isso?

CV: A translocação bacteriana precisa é mensurada pela coleta de órgãos para subsequente cultura bacteriana para confirmar a colonização de bactérias fora do intestino. Esse processo envolve eutanásia das aves para coleta de órgãos e ter o equipamento estéril para coletar órgãos para a cultura, o que é difícil de alcançar em um ambiente de granja.

Existem métodos para medir inflamação geral e medidas indiretas para o intestino permeável utilizando soro, tecido intestinal ou amostras fecais não invasivas (marcadores inflamatórios, soro FITC-d, proteínas de junção de oclusão ou calprotectina), mas esses métodos ainda requerem equipamentos de laboratório (qPCR, RNAseq ou equipamentos de leitor de placas). Um nível basal normal/saudável também deve ser estabelecido para comparação. Este nível de linha de base difere com base nas condições de raça e criação. Esses requisitos de ensaio são adequados para condições de pesquisa para avaliar diferentes tratamentos, mas tornam a avaliação da inflamação intestinal ou translocação bacteriana bastante difícil em nível de granja.

AP: Qual é a sua mensagem para levar para casa para a academia e para indústria pecuária sobre a translocação bacteriana?

CV: A translocação bacteriana é multifatorial, mas a melhor maneira de controlar a translocação bacteriana é através do bom manejo, controlando o meio ambiente, a qualidade da alimentação e formulações, bem como os programas de prevenção de doenças. Todos esses elementos andam de mãos dadas com gerenciamento de qualidade.

AP: Muito obrigada por compartilhar seu conhecimento!

Especialista Christine N. Vuong
Ph.D., Cientista pesquisadora, Universidade de Arkansas, EUA

Christine N. Vuong é cientista pesquisadora do Laboratório de Saúde Avícola da Universidade de Arkansas, especializada em doenças infecciosas. Ela obteve seu Ph.D. em imunologia na Texas A&M University, EUA, antes de concluir seu pós-doutorado em desenvolvimento de vacinas no departamento de Ciência Avícola da Universidade de Arkansas.
 

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